Relação entre a bomba atômica e seu videogame? Pois é. A História – minha área de formação – tem esse tipo de loucura aos montes. Na verdade, faz bastante sentido, uma vez que a História dos videogames está intimamente ligada à história da computação no pós-Segunda Guerra Mundial. A guerra através da história humana tem sido um fator motivador de novas tecnologias e o videogame passa por essa corrente também.
As primeiras tentativas de criação de computadores que
jogassem alguma coisa nasceram em laboratórios de computação e eram basicamente
exercícios teóricos. A tarefa de ensinar um computador (e por computador pense
em máquinas do tamanho de prédios que recebiam instruções através de cartões
perfurados) a jogar xadrez foi por muito tempo um objetivo lendário de
cientistas da computação. Nesse processo acabavam surgindo máquinas que podem
ser vistas como games primitivos, mas que não foram na época encarados assim.
Um deles o Ninrod - que jogava Nim... uma variação estrangeira de palitinho ou algo assim - até ficou super popular em feiras de inovação, mas no limite foi criado pelo desafio técnico.
Um dos que se engajaram na busca do computador enxadrista foi o lendário Alan
Turing, conhecido como pai da computação moderna e vítima do pensamento
retrógrado de sua época. Condenado por “indecência” por ser homossexual (você
leu certo, e isso ainda existe em países hoje em dia, desgraçadamente) ele
acabou se suicidando com apenas 42 anos em 1954. Para quem quiser saber mais
sobre o gênio dos primórdios da informática que decifrou códigos nazistas na
guerra, o excelente filme O Jogo da Imitação conta sua vida.
O Nimrod, de 1951, é o ancestral mais antigo dos videogames, ainda que seu objetivo não fosse entretenimento |
O primeiro protótipo de jogo eletrônico criado para
entretenimento se chamava Tennis for Two
e foi criado pelo físico William Higinbotham em 1958, como parte de uma mostra
de tecnologia do Laboratório nacional BrookHaven nos EUA. O jogo rodava em um
computador analógico e era apresentado num osciloscópio (pense no visor de
monitor cardíaco).
Reprodução de Tennis for Two em oscilóscopio |
Aí chegamos então ao que muita gente considera como o
primeiro videogame de todos os tempos: Spacewar!
O game rodava num glorioso DEC PDP-1 (com seus colossais
9.216 bytes de memória padrão e clock de 200 kilohertz... História é
legal!) e era bem mais complexo do que Tennis
for Two. Spacewar! é um combate entre duas naves espaciais que são
constantemente atraídas por um centro gravitacional no meio da tela. Os
jogadores controlam a rotação das naves, a propulsão e atiram, tentando
destruir o oponente. Foi desenvolvido por Steve Russell, Martin Graetz e Wayne Wiitanen, então estudantes do MIT
(Massachussets Institute of technology) e nerds homéricos, fãs de ficção
científica pulp e entusiastas da programação como algo criativo. O jogo era
distribuído pelos criadores a quem pudesse rodá-lo, uma vez que os computadores
da época eram caros demais para justificar ganhos comerciais sobre ele, e
ganhou fama entre programadores e visionários da indústria de entretenimento.
Foi da iniciativa de vários empreendedores e malucos de plantão de transformar Spacewar! em algo vendável (de início um
fliperama a moedas) que todo o caminho até o seu Playstation 4 sujo de Doritos
se abriu.
É bastante fascinante pensar no tipo de geek tarado que é
necessário para olhar para uma tela do que era basicamente um instrumento de
medir ondas e pensar “dá pra fazer alguma coisa legal com esse negócio, eu sei!
”. É graças a essas pessoas que nossa história começou e evoluiu até a complexa
forma expressiva e imensa indústria que é hoje, e eu sou muito grato.
Para quem queira viver um pouco dessa história - e se impressionar com o que um nerd motivado conseguia fazer nos anos 1960 - o link abaixo tem o código original de Spacewar! rodando em um emulador de PDP-1.
Jogue aqui : http://www.masswerk.at/spacewar/
Mais informações e fontes:
Mais sobre Spacewar! no site do museu da história da computação:
Ótimo Livro sobre a História dos videogames
Donovan, Tristan. Replay: The history of videogames.Yellow Ants, Sussex, UK, 2010.
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